ezra pound e o tênis

Pound é uma das figurinhas de selo literário das mais importantes. Engraçado, oras sério, porém em ambas as ocasiões, imprevisível. ABC da Literatura, pequeno manual de sua autoria destinado aos jovens com interesses em criação literária, é um livro essencial e que muito tem a contribuir. Não só por suas introduções a métrica, exercícios de composição e direcionamento de leituras, mas também, pela própria forma que Pound se expressa, que é divertidíssima, ácida e crítica quase sempre quando pode. É como uma conversa sincera, entre ele, suas verdades intocáveis e o pobre estudante leitor.

Em outras palavras, suas palavras, o livro, mas especificamente a lista de poemas escolhidos por ele como essenciais, são justamente o necessário que , em analogia, uma pessoa teria de saber para julgar os atletas com mais condições de enfrentar a Taça Davis.

Senhor Pound adora analogias.

Ezra contradiz aquela sempre em moda sentença que acredita que o poema brota. Assim, veio ao mundo, "do nada". Só se for do nada ao nada.

E agora mais outra analogia.

Sim, o poema pode brotar (cafonice aguda), porém, as melhores obras são aquelas nas quais esse tal brotamento acontece quando a técnica (chamada segunda natureza) ocorre instintivamente. Assim, como um jogador de tênis não precisa pensar em cada posição de seu músculo durante um movimento em meio a uma partida.

Em pequenas palavras, nada adianta um impulso divino se não se sabe segurar corretamente uma raquete.

Como esse livro era encomendado pelo seu editor para ser uma espécie de apostila escolar, esse tipo de tática educacional é válida e cumpre bem seu trabalho. Mas fico pensando na decisão de optar pelo jogo de tênis como ilustração, poderia ser qualquer outro esporte. Não saberia dizer como estava a fama do ping-pong nessa época, mas ao se tratar de poesia, se me permite sr. Pound, daria uma ideia. Naquela parte em que é tratada a máxima "grande literatura é simplesmente linguagem carregada de significado até o maior grau possível", você poderia adicionar algo como "pense na prosa como uma partida de tênis, já a poesia, uma pelada de ping-pong". Super-concentração e perspicácia com os mínimos e mais sutis movimentos.

Pensar em escrever como um jogo é um exercício que chama atenção. Contra quem se compete? Um editor resmunguento, um mercado comercial e fechado, contemporâneos descolados, ou mais psicologicamente falando, ó, o próprio escritor? O próprio e suas perturbações, endividamento financeiro em tantos manuais de leitura, romancistas e cursos de línguas estrangeiras, promessa aos amigos de terminar alguma espécie de obra, de provar aos pais que não se é um preguiçoso, derrotado e excelente cliente para as ciências clínicas da mente, o próprio e sua articulação de vontade mais dedicação e talento. De qualquer forma, imaginarei daqui para frente o rosto a ranger da russa Maria Sharapova como obstáculo, quando tentar escrever.

Mas o que sei. Sou apenas mais uma viciada em fanopéias as cunhando com pura falta de sucesso, muito longe de ser, pelo menos, uma beletrista.

Ah, se meus joelhos me deixassem, pelo menos, tentar o tênis.

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